terça-feira, 18 de julho de 2017

VIRGEM (1)


VIRGEM
As antigas civilizações do oriente, como a védica, e mediterrâneas, como a egípcia e a grega, tinham pleno conhecimento da influência das  chamadas eras cósmicas no desenvolvimento e na evolução dos povos. As eras cósmicas foram estabelecidas em função da passagem do Sol pelas constelações zodiacais, definindo esta passagem, em linhas gerais, segundo cada constelação, por um determinado período, para esta ou aquela civilização, modelos muito semelhantes relacionados com os seus fundamentos religiosos, filosóficos, políticos, sociais e artísticos. Cada período tem a duração de 2.160 anos, correspondente a 30º dos 360º que tem o ciclo completo.  

No chamado zodíaco das constelações esta progressão solar tem a duração de 25.920 anos, o chamado grande ano pitagórico, correspondente a um deslocamento solar de 360°, e de 2.160 anos se considerarmos o trânsito do Sol através de uma única constelação (30°). Este ciclo composto pelas doze constelações, baseado na chamada precessão dos equinócios,  nos permite perceber que há ciclos de tempo muito mais extensos dos que usamos normalmente, de grande importância para o entendimento da evolução da humanidade como um todo.



A era cósmica em que nos encontramos hoje, a de Peixes, começou em 498 dC. e terminará em 2.658 dC. As eras que a antecederam têm as seguintes datas de ínicio: Áries (1.662 aC), Touro (3.822 aC), Gêmeos (5.982 aC), Câncer (8.142 aC), Leão (10.3102 aC.). Estamos hoje na terceira e última fase da era de Peixes, que começou no ano de 1.938. 

As eras cósmicas são a própria memória do mundo. Os ciclos precessionais, que as determinam permitem-nos interpretar a história da humanidade já que marcam elas o aparecimento de raças, nações e religiões. Determinam inclusive o nascimento, a ascensão e a morte de uma raça raiz. O grande ano zodiacal de 25.920 anos se divide em quatro períodos (estações) de 6.480 anos, formados cada um por três eras cósmicas. O predomínio da raça ariana teve início quando o Sol ingressou na constelação de Áries, em 1.662 aC, e se estenderá até 4.818 dC, nele se incluindo as eras de Peixes e de Aquário. No período anterior ao do domínio da raça ariana, tivemos a evolução, a ascensão e a decadência da chamada raça atlante, durante as eras de Câncer, Gêmeos e Touro. 


GRAHAM   HANCOCK
As mais antigas referências que temos sobre Virgem nos apontam para um período muito recuado, a-histórico, anterior ao ano 10.000 aC. Foi por esse tempo, quando o Sol transitou de Virgo para Leão, como está hoje comprovado por pesquisas arqueológicas conduzidas por Graham Hancock e outros, que antigos povos, habitantes da região que mais tarde receberia o nome de Egito, levantaram um monumento para celebrar tal passagem. Refiro-me à esfinge de Gizé, uma estátua de pedra calcária, uma figura mítica, formada pela cabeça de uma mulher e por um corpo de leão com asas de águia. 

ESFINGE   DE   GIZÉ
DEMÉTER
( J.A.WATEAU , 1770 - 1718 ) 
Estudos recentes (séc. XX), contrariando o que a egiptologia tradicional sempre defendeu erroneamente, comprovaram que a parte humana da estátua era a cabeça de uma deusa das colheitas, a deusa Ísis, irmã e esposa de Osíris, associada mais tarde por Heródoto à deusa Deméter, dos gregos, e à deusa Ceres, dos romanos. Ela era representada nesta forma como uma mulher de porte majestoso segurando na mão um maço de ramos de trigo que ela teria lançado nos céus para formar a Via Láctea. Nas histórias que os egípcios nos contam sobre ela, uma variante nos diz que, desgostosa com o comportamento dos humanos, ela  se retirou da terra numa idade que corresponderia à da Idade da Prata da mitologia grega.

Uma das melhores maneiras de se apreender as principais características do signo de Virgem está na analogia, na solidariedade, que há  entre a mulher e a agricultura. Esta solidariedade pode ser descrita, num primeiro momento, através da aproximação da fecundidade da terra,  da  capacidade geradora do elemento feminino, aproximação fundamental para que seja possível a aquisição de uma consciência de que a vida, a morte e o renascimento são interdependentes.


MÃE DOS CEREAIS
No cenário “agrícola” do signo de Virgem as suas características mais marcantes estão certamente no poder da colheita e na destinação do que se colheu. Inúmeros ritos e costumes, ao logo da história do homem, atestam estes poderes. Eles sempre foram vistos como uma força sagrada e representado por figuras míticas. Quaisquer que sejam os modelos, eles giram invariavelmente em torno da figura de uma Grande Mãe, chamada geralmente de Mãe do Milho, Mãe do Trigo, Mãe dos Cereais etc.  

Em muitas tradições, desde tempos pré-históricos, era comum o sacrifício de seres humanos por ocasião das colheitas. Na mitologia grega, por exemplo, as reminiscências deste rito estavam em certas passagens míticas. Uma história grega nos fala de Litierses, um filho bastardo do rei frígio Midas. Ele possuía muitas terras, inteiramente ocupadas pela cultura do trigo. Era conhecido como o ceifeiro maldito. Sempre que, no tempo das colheitas, um estrangeiro passasse pelos seus domínios ele lhe dava hospedagem e o convidava a segar o trigo. Este convite era um desafio, uma competição. Se o estrangeiro ceifasse o trigo mais rapidamente que ele poderia ir embora. Se não, o que sempre acontecia (Litierses era imbatível na ceifa), ele o matava, decapitando-o, e lançava o corpo da vítima despedaçado nos campos. Esta história termina quando Hércules, a serviço da rainha Ônfale, foi incumbido de enfrentá-lo. Nosso herói o venceu e o decapitou.  


OS   CEIFADORES  ( PIETER  BRUGHEL , 1565 )

Evidentemente, o que temos aqui, por trás do mito, é o costume antiquíssimo do sacrifício de uma vítima humana para a regeneração da força manifestada na colheita, um sacrifício no qual se repete o ato que deu vida aos grãos (para que algo nasça é preciso que algo morra). O homem primitivo, compreenda-se, viveu durante milhares e milhares de anos na ansiedade quando das colheitas, pois poderiam esgotar as forças geradores da terra. Além disso, havia o medo de que o Sol não voltasse quando de sua viagem hibernal, que a própria Lua, tão próxima, também resolvesse desaparecer ou que a semente, por uma razão qualquer, não vingasse. Daí, o costume de se oferecerem as primícias (os primeiros frutos) para ser tentada uma reconciliação com todas estas forças que agiam no interior da terra e nos frutos como também para ser obtida a permissão de consumir os produtos obtidos sem risco nenhum. 


HÓRUS  ,  OSÍRIS ,  ÍSIS 

Embora Ísis, devido à sua enorme popularidade entre os egípcios assimile traços de outras deusas gregas (Hera e Afrodite) é com Deméter que ela mais se identifica. A história desta deusa nos foi contada por Plutarco, historiador grego. Revela-nos ele que ela era filha de Geb e de Nut. O primeiro lembra o Kronos grego e a outra, Reia, ambos, titânidas, filhos de Urano e de Geia, que formam as divindades regentes da segunda dinastia da mitologia grega. Ainda muito jovem, Ísis foi escolhida por seu irmão Osíris para ser sua esposa. Dessa união nascerá Hórus, que, com os pais, constituirá a grande tríade religiosa egípcia.   

NA  RODA  DE  FIAR
( CORNELIS KOPPENOL )
Ísis nasceu no quarto dos dias epagômenos (entre os egípcios, diz-se de cada um dos cinco dias adicionados ao ano civil , que compreendia doze meses de 30 dias cada um; epago, em grego, quer dizer levar, transportar). Subindo ao trono com seu irmão mais velho, ela o ajudou na sua obra civilizadora, ensinando às mulheres a fiar o linho e tecer; ela também ensinou aos homens a arte da cura de doenças e os inspirou a viver em núcleos familiares, instaurado a cerimônia matrimonial (vínculo ritual pelo qual a mulher se torna mãe). 


ÍSIS

Como Osíris viajava muito, ocupado com o seu culto (conquista pacífica do mundo), Ísis se tornou a regente do país, sempre governando sabiamente. Imensa foi a sua dor quando tomou conhecimento do assassinato de Osíris por Seth, o Violento, irmão de ambos. Cortou os seus cabelos, rasgou as suas vestes e partiu à procura no rio Nilo da arca onde, segundo soubera, o corpo despedaçado do marido estava encerrado. Levada pela correnteza do rio até o mar, a arca chegou à costa fenícia. Numa praia, a arca foi ter a um tronco oco de um tamárix, nele se alojando, sem nenhum sinal exterior de sua presença nele.

A esse tempo, o rei de Biblos estava construindo um palácio e muitas árvores eram abatidas. Uma delas foi este tamárix, usado para escorar o teto da edificação. Logo se espalhou a história que desse tronco se desprendia um perfume estranho. Chegando tal história a Ísis, ela logo se dirigiu ao local. Sem revelar quem era,
ASTARTE
conseguiu se fazer receber pela rainha Astarte, que lhe confiou seu filho recém-nascido, tornando-se Ísis assim a ama da criança. Enquanto esperava uma oportunidade para se aproximar melhor do tronco da árvore, Ísis cuidou do jovem príncipe. A criança, todas as noites, era purificada por ela, segundo determinados ritos de calcinação, cujo objetivo era o de torná-la imortal. A rainha, contudo, a surpreendeu numa noite quando da prática de  tal rito. Nesse momento, Ísis revelou quem era e o motivo da sua vinda a Biblos. Obteve logo o tronco da árvore, abriu a arca, vertendo copiosamente suas lágrimas sobre os restos de Osíris, e, levando a arca para o Egito,  escondeu-a numa região pantanosa, para afastar a possibilidade de Seth encontrá-la. Nem todas as partes do corpo de Osíris, entretanto, estavam na arca. Seth, para impedir a reconstituição do corpo do irmão, distribuíra, por vários lugares, em catorze pedaços, o seu restante, pretendendo, com isso, aniquilá-lo para sempre. 

Sem se desesperar, Ísis se pôs a procurá-los, encontrando todos, menos o pênis, que um peixe do rio havia devorado. A deusa começou então cuidadosamente a recompor o corpo; ajudada pela sua irmã Neftis, por seu sobrinho Anúbis, por Toth, o vizir do
EMBALSAMAMENTO
defunto, e por Hórus, seu filho póstumo, que ela havia concebido unindo-se ao cadáver de seu marido, magicamente reanimado por seus encantamentos. Ísis praticou pela primeira vez, os ritos de embalsamamento, que proporcionaram ao deus assassinado uma vida eterna. Depois de tudo isso, a deusa se retirou e para escapar da fúria de Seth refugiou-se nos pântanos, a fim de educar seu filho Hórus, até que atingida por ele a idade adequada para poder vingar o pai. 

Graças à proteção e aos encantamentos da mãe, Hórus conseguiu escapar de todos os perigos. A deusa era detentora de uma magia que astuciosamente obtivera do deus Ra, quando a seu serviço. Tal aconteceu quando Ra, tomando a forma de um velho de membros trêmulos e de boca babosa, vindo a perambular pelo mundo dos mortais. Ísis, usando terra impregnada da baba do deus, fabricou uma serpente venenosa, que, colocada no caminho do velho deus, o mordeu. Incapaz de se curar, Ra teve que recorrer à deusa, que o salvou. Foi nessa ocasião que Ísis, segundo o mito, se apoderou do nome secreto de Ra, conquista que lhe permitiu estender o seu poder por todo o universo, sendo adorada, por isso, em todo o mundo mediterrâneo, como deusa suprema e universal. Mãe da natureza, dos elementos, divindade tutelar dos manes, tornou-se Ísis o centro de vários círculos esotéricos, sendo considerada como aquela que detém os poderes da vida, da morte e do renascimento. Passou ela a personificar desde então a anima universal, e, quanto ao mundo masculino, a somatória de todas as tendências femininas do seu psiquismo.  


TEMPLO   DE   PHILAE

Ísis, no mito osiriano, representa a terra fértil do Nilo, fecundada anualmente pelas cheias do rio, isto é, por Osíris, que separa dela Seth, o deserto. Seu culto não cessou de crescer em importância, a ponto de praticamente apagar o de todas as demais deusas. Ultrapassando as fronteiras do Egito, foi o seu culto levado por viajantes e comerciantes para o mundo greco-romano, de onde alcançou as margens do rio Reno, na Germânia. Nas margens do Nilo, ela conservou seus fiéis até o séc-IV dC. Somente no séc. VI, sob o reino de Justiniano, que o templo de Philae, seu principal santuário no extremo sul do país, foi fechado e transformado em igreja católica. 


APULEIO
As festas em honra a Ísis eram celebradas na primavera e no outono, como, aliás, as dos Mistérios de Elêusis, na Grécia. As descrições que Apuleio (escritor latino do séc.II dC) nos deixou sobre as majestosas procissões em sua homenagem podem nos dar, ainda que muito imprecisamente, algumas informações sobre os seus ritos iniciáticos (isíacos). Ísis sempre foi representada como uma mulher majestosa, levando na cabeça uma espécie de coroa estilizada, um ideograma de seu nome. Aparece a deusa às vezes ostentando um disco na cabeça; em outras ocasiões, lembra a deusa Hathor, pelo seu teriomorfismo (cabeça de vaca). Seu emblema era
CRUZ   ANSADA
um nó mágico de nome Tat, chamado nó de Ísis, ou cruz ansada, uma união simbólica do céu e da terra,  e o sistro (trombeta aguda), também símbolo de Hathor.  A escultura e a pintura a representam geralmente ao lado de Osíris, a quem dá assistência e protege, o mesmo fazendo também, de um modo geral, com todos os mortos, com seus braços abertos, como asas. Em algumas representações, aparece chorando ao lado dos sarcófagos ou velando os vasos canopos, onde se guardavam as vísceras dos mortos. Numa outra forma, aparece aleitando Hórus ou o protegendo quando de suas lutas contra Seth.



ÍSIS   ALEITANDO   HÓRUS

Uma grande semelhança pode ser apontada entre Ísis, nas representações em que aparece segurando Hórus, como puer aeternus, nos seus braços, e Perséfone, que, na segunda fase dos Mistérios de Elêusis, a epopteia, carrega num dos braços Brimo, o mesmo puer aeternus, e numa das mãos um feixe de trigo. Ligado a Atenas pela chamada Via Sacra, o santuário de Elêusis estava sob a tutela de Deméter (Grande Mãe) e de Koré, sua filha, divindades do mundo vegetal e de seus ciclos. Elêusis foi sempre um teatro de cerimônias iniciáticas, cujos ensinamentos, de caráter absolutamente esotérico, não podiam ser divulgados sob pena de morte, pena que era também aplicada àqueles que, não iniciados, resolviam ingressar no santuário sagrado. 


ELÊUSIS

Os vestígios desse santuário podem ser hoje visitados no alto de uma acrópole que domina o golfo de Elêusis e a ilha de Salamina. É de se salientar que arqueólogos ingleses e franceses pesquisaram o local no séc. XIX. A partir do fim do período romano da história grega e da imposição do cristianismo como sua religião oficial, as majestosas instalações do santuário entraram em decadência, ficando o lugar cercado por uma topografia confusa, mas envolvendo-o sempre, ainda hoje, um halo de sopro espiritual ao qual se misturam a poluição proveniente de uma estrada cujo trânsito é bastante pesado. À volta das ruínas, algumas flores, lembranças de um tempo em que elas se espalhavam por toda a região, hoje substituídas por “florescentes” usinas.  

Segundo a mitologia, foi em Elêusis que Deméter encontrou a sua filha Koré, que fora raptada pelo deus Hades perto do lago de
GRÃOS  DE  TRIGO
Pergusa, na Sicília. O rei de Elêusis, Keleos, tendo oferecido hospitalidade à deusa, ela, em agradecimento, deu a Triptólemo, filho do soberano, o primeiro grão de trigo  e lhe ensinou a arte de fazê-lo frutificar. Uma estela do séc. V aC, encontrada em Elêusis, hoje no Museu Arqueológico de Atenas, ilustra a doação da deusa ao jovem príncipe. Simultaneamente, Deméter teria comunicado ao grão-sacerdote Eumolpo o ritual do culto da fecundidade.

Deméter, como se disse, era a deusa do trigo, da fecundidade dos campos, e sua filha Koré, tendo assumido a posição de deusa do mundo ctônico devido às “artes” de Hades, como Perséfone, acolhia os mortos quando lá chegavam. Este culto, sem dúvida, tem origem, num primeiro momento, no Egito e, depois, no mundo cretense e egeu, por onde se introduziu na Grécia. O culto que se celebrava no interior do santuário era reservado só aos iniciados, sendo, porém, franqueadas a todos  as festas que se realizavam exteriormente. 

Inicialmente, um culto agrário de fecundação da terra, os Mistérios eleusinos se tornaram, possivelmente sob a influência do orfismo, uma espécie de terapia coletiva, embora alguns o vissem como uma religião de salvação. Os Mistérios, principalmente devido à relevante participação de Dioniso, estavam abertos a todos, sem distinção de classe ou de sexo, mesmo os escravos nele eram admitidos se originários de colônias gregas, tudo muito diferente dos cultos apolíneos, de caráter aristocrático. Os bárbaros, inclusive, poderiam deles participar se se naturalizassem. 

A pessoa que quisesse se iniciar deveria se apresentar a um funcionário sacerdotal através de um ateniense já iniciado. Este funcionário assumiria então a condição de mistagogo (professor) perante o candidato. Aceito, participaria então o candidato dos Pequenos Mistérios, em Agra, que começavam por uma purificação no rio Ilyssos. Ao logo dos seis meses seguintes os candidatos iam
ELEUSINION
se tornando mystai (iniciados). No outono, tinha início a segunda fase, a dos Grandes Mistérios, que começava em meados de setembro, segundo o nosso calendário. No dia determinado, alguns efebos iam a Eleusis buscar os hiera, objetos sagrados (de composição ignorada para nós), que, no dia seguinte, deveriam ser levados em procissão a um templo de Atenas, o Eleusinion, em procissão com muita pompa.  

No dia seguinte, chamado ogyrmos (reunião), todos se reuniam sob um pórtico de Atenas e o arconte-rei, numa oração, conclamava a que se afastassem dali todos aqueles que, por qualquer razão, estavam impuros, manchados por um crime qualquer, ou marcados pela atimia (privação dos direitos de cidadania), Depois, iam todos
ASCLÉPIO
ao mar para outra purificação, sacrificando-se em seguida uma leitoa ainda em fase de aleitamento (khoiros, nome também do órgão genital feminino). Nos dois dias seguintes realizavam-se as festas em honra a Asclépio, dentro do calendário eleusino. No dia 19 de setembro, à noite, tinha lugar a grande procissão noturna que levava os hiera de volta a Elêusis, tudo sob a tutela de Dioniso, o deus das metamorfoses. A saída de Atenas se dava pelo cemitério da cidade, chamado 
Cerâmico (bairro onde viviam e trabalhavam oleiros, ceramistas etc.). 


CERÂMICO

Pela região de Agra, fora dos limites de Atenas, território pequeno, mas muito rico (plantações de trigo e centeio), seguindo a Via Sacra, atingia-se ao cair da noite, depois de muitas paradas, com danças e sacrifícios, o território sagrado eleusino, atravessando-se a ponte do rio Cefiso, que separava o profano do sagrado. Essa travessia era marcada por gritos e expressões chamadas geferismos (gephyra, ponte) que incitavam os mystai a atravessar o rio Cefiso, que, como se disse, separava o mundo profano do mundo sagrado, o do santuário.  

As cerimônias que se realizavam estão constituíam a primeira fase dos Grandes Mistérios, a chamada teleté (tele, em grego, é longe; uma referência aos que tinham feito a viagem). Era o primeiro grau da iniciação. Sob a tutela de Dioniso, esta fase se compunha de uma orgia (cantos, danças e bebida, o kykeon), através da qual se atingia um êxtase (sair de si) e se chegava finalmente ao entusiasmo (deus em nós).

Os depoimentos sobre estas experiências afirmam unanimemente que elas lembravam o caminho titubeante das almas nas trevas, presas de inúmeros terrores. Subitamente, porém, como que atingidas por uma intensa luz as almas se sentiam livres, passando a descortinar paisagens maravilhosas, campos férteis. Essas concepções têm forte conotação órfica ou egípcia, segundo seus costumes funerários, conforme Platão notou. 

PERSÉFONE
A segunda fase dos Grandes Mistérios, realizada no interior do templo (Telesterion), tinha o nome de epopteia (a grande visão). Lá, na obscuridade, representava-se uma pequena encenação teatral, a procura de Koré por Deméter e o retorno da primeira à luz, uma simulação dos desencontros da alma e o seu retorno. Aparecia na encenação, segundo depoimentos, uma enorme figura feminina (Perséfone), com ramos de trigo nas mãos, e carregando num dos braços uma criança, Brimo, o puer aeternus, a vida que sempre renascia, mas sempre de outro modo. Nestes espetáculo os sacerdotes conclamavam os mystai a se abrirem para uma outra forma de vida pois “agora eles haviam visto”, isto é, haviam se tornado epoptes.