segunda-feira, 19 de outubro de 2015

MARCEL PROUST E VINTEUIL



MARCEL   PROUST



Talvez o maior romance da literatura moderna, Em Busca do Tempo Perdido, de Marcel Proust, se compõe de sete livros: No Caminho de Swann, À Sombra das Raparigas em Flor, O Caminho de Guermantes, Sodoma e Gomorra, A Prisioneira, A Fugitiva e O Tempo Recuperado. 





Em toda a obra de Proust, a arte em geral ocupa um lugar de grande destaque, especialmente a música. Uma pequena frase de uma sonata, a de Vinteuil, tem um papel muito importante. Vinteuil é um personagem inventado por Proust, formado por “pedaços” de vários músicos que fizeram parte de seu universo, Saint-Saëns, Gabriel Fauré, César Franck, Richard Wagner, Claude Debussy, George Enescu, Reinaldo Hahn e talvez outros.

A pequena frase de Vinteuil aparece diversas vezes, fazendo um contraponto com certos acontecimentos de natureza psicológica sobre os quais sua influência é determinante. Em Proust, a verdadeira vida está por trás da vida aparente, abusivamente chamada de real, diz ele. Através dos seus personagens, ele recupera este real impalpável de várias maneiras. Um deles, talvez o mais propício, seja a música, a frase de Vinteuil.

O que Proust acabou nos propondo, uma aventura literária única, foi um modo novo de se ver o mundo. Esta proposta partia da ideia de que cabe ao escritor, ao poeta, extrair o principal, o essencial, das sensações para, juntando-se tudo em metáforas, colocá-las fora das contingências temporais. A estética proustiana estava escorada em muitas ideias do tempo (Bergson, por exemplo), mas o modo pelo qual ele consegue dar forma a tudo isso é absolutamente inovador. 

Não é possível, dizia ele, que uma música, uma pintura, que nos tenham comovido, não correspondam a uma realidade espiritual. O artista não inventa, ele descobre. O universo aspira confusamente a entrar em contacto conosco. Depende de nós o rompimento dessa espécie de encantamento que torna as coisas prisioneiras, de içá-las até nós, de impedir que elas mergulhem para sempre no nada.


CENA   DE   UN   AMOUR   DE   SWANN

A música, em Proust, é um dos meios que temos para estabelecer esse contacto, para que as brechas, como ele dizia, nos permitam o acesso. No conjunto de suas obras, Proust, pela memória afetiva, recriou impressões, aprofundou-as, iluminou-as, transformando-as em elemento de inteligência. Foi um renovador da psicologia ao refazer o caminho de volta da introspecção, um declive abrupto, para que pudessem aflorar ao conhecimento fenômenos inconscientes, muito distantes no tempo. Assim como Cézanne, Rimbaud ou Renoir, Proust soube revelar, principalmente com o estímulo da música, a beleza lá onde não conseguíamos percebê-la, nos objetos mais comuns, nas coisas humildes e esquecidas, inclusive na vida profunda das naturezas mortas.


CENA   DE   LE   TEMPS   RETROUVÉ  ( SONATA  DE  VINTEUIL )

Para quem quiser mergulhar um pouco mais no universo proustiano, obrigatórios dois filmes excepcionais: Un Amour de Swann (Um Amor de Swann), de 1984, de Volker Schlöndorff e Le Temps Retrouvé (O Tempo Redescoberto), de 1999, dirigido por Raoul Ruiz.